Quando um vendedor de churros de 46 anos aceitou marmitas oferecidas por um conhecido, em 21 de julho do ano passado em Itapevi (Grande SP), não imaginava que a refeição estava envenenada. Seu filho, na ocasião com 11 anos, consumiu o alimento contaminado com chumbinho, agrotóxico usado ilegalmente para matar ratos e, desde então, permanece internado e em tratamento.
O sofrimento de pai e filho completou um ano na quarta-feira (21) e, até o momento, nenhum suspeito pelo crime foi identificado ou preso pela polícia.
Dois moradores de rua, sendo um deles que entregou três marmitas para o vendedor, morreram no dia seguinte, após consumirem o mesmo alimento. A presença do chumbinho foi constatada após perícia e, segundo investigação da Polícia Civil, as refeições foram envenenadas depois de serem entregues às vítimas.
O menino foi encaminhado na ocasião ao Hospital Geral de Pirajussara, em Taboão da Serra (Grande SP). Ele permaneceu na unidade de saúde até o fim de outubro do ano passado, quando foi transferido para a Associação Cruz Verde, entidade referência em paralisia cerebral na Vila Clementino (zona sul da capital paulista), de acordo com a Secretaria Estadual da Saúde. A pasta não comentou sobre o estado de saúde do garoto.
“Meu menino parou de falar, de movimentar braços e pernas. E na época do envenenamento, sentia muita dor. Ele chegou a sofrer duas paradas [cardiorrespiratórias] e teve algumas sequelas cerebrais, que afetaram a coordenação dele”, afirmou o pai.
O garoto passou a ter acompanhamento especializado, segundo o pai, com fisioterapeutas e fonoaudiólogos, por exemplo. E de acordo com ele, o tratamento já dá resultados, como ganho de peso e de coordenação do filho, que ainda não consegue falar e é alimentado por meio de sonda.
Apesar disso, o pai dele se sente revoltado, pois nenhum responsável por envenenar as marmitas foi identificado. “Quando falei com a polícia, disseram que ‘estão procurando com calma’ a pessoa”, afirmou. “Meu filho era uma criança normal. Brincava, me ajudava no serviço”, desabafou.
Segundo a polícia, a equipe da delegacia de Itapevi já ouviu cerca de 30 pessoas e aguarda o resultado dos laudos periciais, que estão em elaboração.
Os 12 anos do garoto foram comemorados com uma festa, com direito a bolo e bexigas, nas dependências da Cruz Verde, em 17 de abril. “Queria que meu filho tivesse feito aniversário em casa, brincando e correndo, como ele gostava de fazer. Mas, graças a Deus, ele está vivo e melhorando cada dia um pouquinho”, ressaltou o vendedor, que não soube informar quando o garoto poderá voltar para casa.
O advogado Nelson Issao Hoshino acompanha a investigação do caso, dando assistência jurídica ao pai do menino. Ele afirmou ao Agora que a grande dificuldade da polícia é conseguir coletar depoimentos das pessoas em situação de rua, que conviviam com Vagner Aparecido Gouveia de Oliveira, 37 anos e José Luiz de Araújo Conceição, 61. Ambos morreram com sinais de intoxicação, na madrugada de 22 de julho do ano passado, após comerem das marmitas envenenadas.
“É difícil localizar e identificar essas pessoas em situação de rua e, quando isso aconteceu, foram prestar depoimentos alcoolizados, dificultando a oitiva”, ilustrou.
O caso
Na noite de 21 de junho, o morador de rua Vagner Aparecido Gouveia de Oliveira recebeu cinco marmitas de voluntários, das quais deu três para o vendedor de churros. “Ele me deu as marmitas, pois falou que não queria que estragassem”, contou o pai do menino, na ocasião.
O alimento foi doado aos moradores de rua por uma mulher, ligada a uma igreja evangélica, que afirmou na ocasião ter alimentado a própria família com a comida entregue às vítimas. O momento em que a comida foi deixada no posto de gasolina desativado foi registrado por uma câmera de monitoramento.
A então namorada do vendedor, uma adolescente de 17 anos, também comeu uma marmita e passou mal. Ela teve alta, dias depois de ser internada.
Após ser internado, o garoto permaneceu 15 dias na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) do hospital de Taboão da Serra, ainda segundo o pai.